Nem a gravidez precoce as afastou da escola
Ana e Maria são duas adolescentes da província de Nampula que partilham uma história de superação. Ambas engravidaram na adolescência, mas continuaram a estudar durante a gravidez e regressaram às aulas após o parto. Hoje, usam as suas experiências para sensibilizar outras raparigas a evitarem as uniões prematuras e a gravidez precoce.
Ana de 16 anos e Maria de 17 anos, ambas já não têm contacto com os progenitores dos seus filhos, mas graças à sua força interior e ao apoio das suas famílias e comunidades, conseguiram seguir em frente. Hoje, continuam os estudos e frequentam o 8.ª classe, mostrando que a maternidade precoce não tem que ser o fim dos seus sonhos.
Ana e Maria contam as suas histórias

“Quando eu engravidei, ele disse à família que não me conhecia e que eu só queria aproveitar-me das posses da família”
Ana, 16 anos
“No início do namoro, ele dizia que queria casar comigo.
“No entanto, quando engravidei, disse à família que não me conhecia, que a criança era de outro homem e que eu só queria aproveitar-me das posses da família”, conta Ana.
“Os meus pais fizeram queixa na esquadra e ele foi chamado a uma audiência. Após muita insistência, compareceu, mas continuou a recusar-se a assumir a gravidez, repetindo as mesmas justificações.
“O caso deveria ter seguido para tribunal, mas, devido às manifestações pós-eleitorais, tal não aconteceu.”
“Perante isso, a minha mãe decidiu não prosseguir com o processo e apoiar-me durante a gravidez. Levei a gravidez até ao fim e a minha filha nasceu.”
Hoje tem sete meses e, desde então, o pai nunca a veio conhecer nem contribuiu para o seu sustento”, acrescenta Ana.
Maria
A história de Maria, colega de Ana, teve um desfecho um pouco diferente, conta ela:

“Quando fiquei grávida e contei ao meu namorado, ele assumiu a responsabilidade. Fui viver com ele e com os seus dele. Porém, após o nascimento do bebé, a minha mãe Maria decidiu levar-me de volta para casa, acreditando que assim poderia cuidar melhor de mim e da meu filho.
Gostei de voltar para casa, porque, na verdade, nunca quis sair. Aqui sou muito melhor tratada e não tenho de assumir a responsabilidade de uma família inteira”, confessa Maria.
Tal como a Maria, a Ana também não abandonou a escola por causa da gravidez. Pelo contrário, ambas receberam muito apoio das suas famílias, da comunidade e de professores pontos focais de género membros da rede da educação.
Continuaram a frequentar as aulas durante a gravidez, tendo ficado afastadas apenas no período de puerpério: uma semana no caso de Maria e duas no de Ana, antes de regressarem à escola.
Hoje, através do projeto Break Free da Plan International, as duas dedicam-se a sensibilizar outras raparigas da sua idade para evitarem a gravidez precoce, partilhando os desafios que enfrentaram na primeira pessoa.
“Não parei de estudar; fui até aos nove meses de gestação. Quando a minha filha nasceu, fiquei muito feliz por poder regressar à escola. Às vezes, até levo a minha filha comigo e todos querem brincar com ela. No entanto, aconselho sempre: não comecem a namorar antes dos 18 anos e não se deixem enganar pelos rapazes. A gravidez pode causar muitos atrasos e ter consequências graves para a saúde”, partilha Ana, de 16 anos.
“Senti-me envergonhada por estar grávida e ir para a escola, embora nunca tenha sofrido discriminação. Enquanto as outras meninas brincavam, eu não me sentia à vontade para fazer o mesmo. Por isso, aconselho todas as adolescentes a manterem a abstinência e, quando decidirem ter relações sexuais, a usarem preservativo, implante, DIU, pílula ou outros métodos contraceptivos. No entanto, a abstinência continua a ser a melhor opção, pois também previne infecções doenças”, reforça Maria, de 17 anos.
“Senti-me envergonhada por estar grávida e ir para a escola, embora nunca tenha sofrido discriminação”
Maria, 17 anos
Gravidez precoce continua uma barreira ao futuro das raparigas
No entanto, as gravidezes precoces continuam a ser uma das maiores ameaças ao desenvolvimento pleno das raparigas em Moçambique. Muitas jovens, com idades compreendidas entre os 10 e os 19 anos, enfrentam barreiras estruturais e sociais que limitam o seu acesso à informação, à saúde sexual e reprodutiva, à educação e às oportunidades económicas.
Como consequência, milhares de adolescentes tornam-se mães antes de estarem físicamente, emocionalmente e socialmente preparadas, vendo o seu futuro comprometido.
Nampula em destaque, uma das províncias mais afectadas
De acordo com a Agência Moçambicana de Informação, província de Nampula apresenta uma das taxas mais elevadas de gravidez na adolescência em Moçambique, com 44%, ficando atrás apenas as provincias de Cabo Delgado (55%) e Niassa (52%).
Em 2023, mais de 101.954 raparigas entre os 10 e 19 anos engravidaram, o que corresponde a 21% do total de 480.254 mulheres grávidas atendidas nas unidades sanitárias da província.
Os distritos mais afetados são Mogovolas, Murrupula, Mogincual e Mecubúri, onde os índices de gravidez precoce permanecem particularmente elevados. As consequências podem ser profundas, desde o risco de fístula obstétrica, abandono escolar, exclusão social e complicações que afectam tanto a saúde materna como neonatal.
O Break Free o projecto que promove o empoderamento das raparigas
Para mitigar este cenário, está em curso o projeto Break Free ,financiado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros da Holanda e implementado pela Plan International Moçambique.
A iniciativa atua em três postos administrativos do distrito de Mogovolas em Nampula, nomeadamente Nametil, Nanhupo Rio e Iuluti, com o objetivo de de promover a saúde sexual e reprodutiva, o bem-estar dos adolescentes e a igualdade de género, fortalecendo o empoderamento de mulheres e raparigas.
O Break Free impulsiona um verdadeiro movimento social em prol da igualdade de género, do acesso à educação segura, inclusiva e de qualidade, especialmente para as raparigas, e do acesso à Saúde e Direitos Sexuais e Reprodutivos.
Uma das principais estratégias do projeto é o envolvimento ativo de pais, cuidadores, adolescentes, jovens, líderes comunitários e professores como agentes de mudança.
Esses grupos têm dinamizado sessões interativas e discussões comunitárias que fortalecem a compreensão sobre a importância da igualdade de género e o papel de cada pessoa na promoção de transformações positivas dentro das comunidades.
Categorias: Saúde sexual e reprodutiva e direitos conexos